É uma possibilidade excitante que um dia se possa encontrar uma câmara oculta que nos revele informações sobre nosso passado das quais nem suspeitamos. Por isso, vários outros pesquisadores estão procurando meios de descobrir câmaras escondidas e passagens secretas nas grandes pirâmides de Gizé. Dois egiptólogos amadores franceses estão entre eles. Gilles Dormion, um arquiteto, e Jean-Yves Verd´hurt, um corretor de imóveis aposentado, usando análise arquitetônica e um georadar, ou seja, um radar capaz de penetrar em objetos sólidos, em 2004, ano em que publicaram um livro, concluíram que deve existir uma câmara por baixo da câmara da rainha na Grande Pirâmide. Eles pensam que provavelmente essa seria a verdadeira câmara funerária de Kéops, a qual poderia conter artefatos que excederiam em riqueza aos da tumba de Tutankhamon. Se tal cômodo realmente existir, é pouco provável que tenha sido violado e poderia conter também a múmia do rei. Para confirmar ou não a hipótese, bastaria fazer mais alguns buracos no maior monumento egípcio. O problema é que os dois pesquisadores não obtiveram permissão das autoridades egípcias para continuar os estudos e provar essa tese.
Um respeitado egiptólogo, Jean-Pierre Corteggiani, do Instituto Francês de
Arqueologia Oriental no Cairo, disse ter ficado impres-sionado pelo fato de que as imagens do georadar foram coletadas e interpretadas por um técnico de uma empresa francesa especializada nesse tipo de equipamento. Tal perito trabalha para uma companhia que teve como um de seus principais projetos estabelecer a rota do trem expresso que liga Paris a Estrasburgo. Isso significa que para dizer que é seguro colocar os trilhos em determinado lugar, porque não há nenhuma cavidade sob o solo, ele precisa estar absolutamente certo, caso contrário o perigo de desastre seria imenso. Corteggiani também se mostrou intrigado pela localização sugerida para a nova câmara: debaixo da assim chamada câmara da rainha, mas um pouco mais a oeste. Isso a colocaria na interseção das diagonais e exatamente no coração da pirâmide, o que para Kéops teria, provavelmente, forte conotação simbólica como local de descanso.
Outro egiptólogo, Aidan Dodson, perito em arqueologia funerária egípcia, por outro lado, afirmou: Acho implausível a idéia de que a câmara funerária de Kéops ainda esteja para ser achada na pirâmide. Arquitetonicamente não há nenhuma razão pela qual devesse existir um corredor debaixo da câmara da rainha. A câmara funerária sempre foi conhecida. Os autores da possível descoberta argumentam que a pirâmide evoluiu por tentativa e erro. Na medida em que os arquitetos percebiam que os aposentos inicialmente concebidos como câmaras funerárias não suportariam o peso colocado acima deles, voltavam para a mesa de desenho.
Sobre a câmara do rei o telhado é reforçado com vigas de granito, formando um sistema engenhoso para aliviar a pressão sobre o aposento. Entretanto, as vigas racharam, o que se atribuiu tradicionalmente a atividade sísmica ocorrida depois que o monumento foi completado. Gilles Dormion acredita, porém, que o acidente aconteceu durante a construção da pirâmide. Em síntese, segundo ele, quando Kéops morreu havia três câmaras funerárias construídas. A primeira, no sub-solo, permanecia inacabada, a segunda estava disponível e a terceira apresentava problemas de rachadura em seu teto. Kéops foi, então, enterrado na segunda. Ou melhor dizendo, embaixo da segunda, porque a câmara da rainha em si não estava equipada para receber o corpo de um faraó, faltando, principalmente, uma entrada suficientemente larga para acomodar o sarcófago de pedra.
Dormion vem trabalhando nas pirâmides do Egito há mais de 20 anos e, baseado em análises de radar feitas por ele e por Verd'hurt na pirâmide de Meidum, realizadas em 2000, descobriu duas câmaras anteriormente desconhecidas naquele monumento. Em época bem anterior, em março de 1985, ele e Jean Patrice Goidin, um arquiteto, haviam visitado a Grande Pirâmide e feito observações visuais que os levaram a suspeitar da existência de um sistema oculto de passagens e câmaras. Eles teorizaram originalmente que o sistema que nós vemos hoje é de fato um estratagema para enganar os ladrões de tumba, e que a real câmara funerária de Kéops estaria ao lado dos compartimentos que formam o teto da câmara do rei. Um dos indícios está na disposição dos blocos que formam o teto da grande galeria. Por serem paralelos à inclinação da galeria, se constituem em um dispositivo anti-deslizamento que libera de pressões a parede norte. Isso, entretanto, seria desnecessário se tal parede fosse maciça. Naquela ocasião eles também observaram que as paredes da passagem horizontal que conduz à câmara da rainha apresentam blocos de pedra que foram dispostos de uma maneira diferente da de outros blocos do monumento. Eles chamaram a atenção para o fato de que ali os blocos foram postos uns em cima dos outros de forma que as juntas formam um padrão em cruz, completamente diferente do arranjo em qualquer outra passagem do monumento. A visão deles era a de que a parede pudesse esconder um compartimento, possivelmente contendo o equipamento funerário do faraó.
Em 1986 os dois homens voltaram ao Egito e começaram uma pesquisa dentro da Grande Pirâmide empregando microgravimetria, um conjunto de métodos e técnicas de medida da aceleração da gravidade da Terra, que permite calcular a densidade dos materiais. Nos compartimentos do teto da câmara do rei os testes não foram conclusivos, embora eles tenham detectado alguma espécie de anomalia. Outras leituras parecem ter indicado a existência de uma cavidade atrás da parede ocidental da passagem da câmara da rainha, exatamente como eles haviam previsto anteriormente. Dormion teve permissão para perfurar três pequenos buracos na parede. Os dois primeiros revelaram apenas vários blocos de pedra separados por argamassa. O último buraco atingiu uma profundidade de 2 metros e 65 centímetros e revelou uma cavidade com cerca de 40 centímetros de comprimento cheia de areia cristalina muito fina, formada por mais de 99% de quartzo, cuja origem não podia ser eólica nem causada pela erosão do monumento. Embora a investigação tivesse revelado praticamente nada, era prevista a volta da equipe em 1987 para realização de pesquisas mais sofisticadas. Entretanto, antes de que eles pudessem fazê-lo, em janeiro de 1987, uma equipe japonêsa da Universidade de Waseda, sob a direção de Sakuji Yoshimura, assumiu a continuação dos trabalhos.
Com o uso de equipamento de GPR - Ground Penetrating Radar, ou seja, um equipamento de radar que penetra no sub-solo, os japoneses inspecionaram o piso e as paredes da câmara da rainha, no esquema acima representada num corte vertical, e detectaram a presença de uma cavidade por trás da parede norte a uma distância de cerca de três metros. Ela teria 30 metros de comprimento por um metro de largura e um metro e meio de altura.
A seguir examinaram essa cavidade inspecionando toda a extensão da sua parede ocidental e concluíram que ela talvez seja uma passagem oculta que corre paralelamente ao corredor horizontal que conduz à câmara da rainha, o qual também vemos no esquema acima. Conforme o relatório dos pesquisadores, essa espécie de corredor encontrado por eles começa num ponto que fica a uma distância da parede norte da câmara da rainha correspondente à largura de apenas um bloco de pedra e parece terminar em um ponto aproximadamente 30 metros ao norte da câmara. Nesse local, atingindo o ponto onde se encontra a grande galeria, a passagem deve terminar ou virar para oeste em ângulo reto. Os pesquisadores franceses sugeriram que esse corredor deve conduzir a um compartimento oculto no ventre da pirâmide e que talvez esteja aí a verdadeira câmara funerária.
Dormion e sua equipe acreditam que nenhuma das três câmaras existentes na Grande Pirâmide está qualificada para ser uma câmara funerária real. Muitos arqueólogos pensam o mesmo com relação à câmara da rainha e à câmara subterrânea. Os franceses, porém, vão além ao sugerir que a câmara do rei, tida pela maioria dos egiptólogos como, pelo menos, o lugar do descanso inicial do rei, também não pode ter sido uma câmara funerária porque não é bastante forte para isso. A prova está nas profundas rachaduras dos volumosos blocos de granito que formam o teto do compartimento. A verdade é que vários peritos acreditam que tais rachaduras podem ter surgido até mesmo antes da pirâmide ter sido colocada em uso, o que impediria seu emprego final como câmara mortuária, embora a maioria acredite que foi construída com aquele propósito em mente. Por fim, até mesmo aqueles que acreditam que a câmara nunca foi posta em uso, também acreditam que Kéops deve ter sido enterrado em outro lugar, e não em uma câmara escondida na própria pirâmide.
A equipe japonesa também pensa ter descoberto o que parece ser uma cavidade cerca de um metro e 50 centímetros abaixo do piso da passagem horizontal que liga a grande galeria com a câmara da rainha. Eles acreditam que esta cavidade pode ter até três metros de profundidade e que deva estar, provavelmente, totalmente cheia com areia. Essa areia deu motivo a muita discussão. Surgiram até rumores de que seria radioativa. Embora não fosse verdade, quando os técnicos examinaram a areia e compararam-na com amostras de areia de Gizé e de Saqqara, descobriram que era bastante diferente das amostras. Aparentemente a areia foi trazida de longe. Embora os egiptólogos acreditem que os construtores da Grande Pirâmide possam ter usado cavidades cheias de areia para servirem de pára-choques aos efeitos dos terremotos, isto não explica porque não foi usada a areia do próprio local. Em outra série de medições, os japoneses localizaram próximo da câmara subterrânea do monumento um provável aposento com dois metros de altura, situado cerca de três metros atrás da zona oeste da parede norte da referida câmara. Nenhuma pesquisa adicional foi feita até agora para investigar melhor os achados de Dormion e Yoshimura.
Em outubro de 1992, um engenheiro francês, Jean Kerisel, chefiou uma equipe que usou métodos não destrutivos para inspecionar a área ao redor da câmara subterrânea da pirâmide de Kéops. Essa pesquisa estava baseada em teorias que levam em conta o relato de Heródoto, que se refere à existência de um canal por sob o monumento, e a evidência arqueológica da existência desse canal fora do planalto de Gizé. Ele começou seu trabalho considerando o nível da água debaixo da Grande Pirâmide. Usou uma combinação de cálculos originalmente feitos por Vyse e Perring, pesquisadores britânicos que, em 1836 e 1837, cavaram um poço vertical fora da câmara subterrânea com profundidade de 11 metros. Embora acreditasse que o poço de Vyse fosse bastante profundo para alcançar o nível provável de um canal, Kerisel achava que poderia ter sido cavado no lugar errado. Após pesquisar com GPR, o francês confirmou a provável existência do aposento percebido pela equipe de Yoshimura e ainda informou ter detectado — por baixo do piso do corredor horizontal que leva à câmara subterrânea — uma estrutura que poderia ser o teto de um novo corredor. Ele estaria localizado no ponto exato no qual o corredor descendente o atingiria, caso tivesse sido extendido até lá. Esse novo corredor teria cerca de um metro e 60 centímetros de altura, cruzaria o corredor horizontal num ângulo de 45 graus aproximadamente, elevar-se-ia ligeiramente em seu trajeto, parecendo dirigir-se diretamente para a esfinge.
Quando chegou dezembro de 1992 a equipe usou microgravimetria e informou que no ponto onde o radar havia descoberto uma espécie de passagem, o micro-gravímetro nada detectou, o que indicava que o pretenso corredor estava obstruído por dentro. Por outro lado, no corredor horizontal foi detectada uma anomalia local muito clara de uma falha na alvenaria no lado ocidental, cerca de seis metros antes da entrada para a câmara. Isso corresponderia, conforme os cálculos, a um poço vertical com pelo menos cinco metros de profundidade, de seção quadrada, com lados de cerca de um metro e 40 centímetros, junto da parede ocidental do corredor. Kerisel concluiu sua pesquisa afirmando que a passagem descoberta pelo GPR poderia ser simplesmente uma zona de calcário argiloso, do mesmo tipo dos estratos existentes na cabeça da esfinge, mas com a excepcional característica de ser bastante grossa. Quanto ao micro-gravímetro, poderia ter descoberto um volume considerável de dissolução da pedra calcária através da água subterrânea, ou seja, um tipo de gruta profunda, acidente geológico possivel de existir. Embora tenha desejado realizar escavações para investigar melhor suas descobertas, o engenheiro nunca as fez.
Foi também em 1992 que Rudolf Gantenbrink, um engenheiro alemão especializado em robótica, empregando um robô que ele mesmo projetou e construiu, iniciou a exploração do interior dos dois condutos que, a partir da câmara do rei, penetram no interior do monumento. Leia a nossa página O Robô e a Pirâmide para saber mais a esse respeito. Em março de 1993, Gantenbrink explorou o conduto do lado sul da câmara da rainha, quando então encontrou a famosa "porta" que o bloqueia. Foi somente em setembro de 2002 que um novo equipamento conseguiu "espiar" para além dessa "porta", encontrando uma pequena câmara com 17 cm de comprimento bloqueada por outra pedra de aspecto rústico. Na mesma ocasião foi explorado o conduto do lado norte da câmara da rainha e uma porta semelhante surgiu. Leia a matéria O Robô e a Pirâmide — Parte 2 e veja os detalhes dessas descobertas. Leia ainda a página Os Condutos e conheça a estrutura interna deles.
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