O sucessor de Djoser, seu filho Sekhemkhet, que reinou aproximadamente entre 2611 e 2603 a.C., também mandou edificar uma pirâmide de degraus e um conjunto de construções semelhante e próximo ao de seu pai, mas o mesmo ficou inacabado. Aqui já foram usados grandes blocos de pedra, perdendo-se a semelhança com os blocos de adobe. As pedras foram cortadas num tamanho médio de quase o dobro daquelas usadas no monumento de Djoser e evidenciam maior habilidade no corte e na junção das mesmas. A área ocupada pelo complexo tinha aproximadamente o mesmo comprimento, mas apenas um terço da largura daquela ocupada pelo conjunto de Djoser. A pirâmide foi erguida em uma superfície de pedra irregular, o que obrigou os construtores a nivelarem o terreno. Isso exigiu a construção de grandes terraços, dos quais alguns tinham mais de dez metros de altura. Por que o rei escolheu um local tão inadequado para sua pirâmide é um mistério, mas nas proximidades existem algumas tumbas reais da II dinastia (c. 2770 a 2649 a.C.) o que pode ter influenciado na escolha. Provavelmente a base do monumento era quadrada com lados de cerca de 119 metros de comprimento. O projeto da pirâmide previa um total de sete degraus, alcançando altura de cerca de 70 metros. Hoje não sabemos exatamente até que ponto ela foi erguida, pois tudo o que restou foram algumas ruínas com altura de sete metros e, por ter sido encontrada engolfada em areia, recebeu dos escavadores o nome de pirâmide enterrada. Como jamais foi concluída, não foram aplicadas pedras de revestimento. Tampas de jarros feitas de barro encontradas nos subterrâneos da pirâmide e grafadas com o nome daquele faraó, permitiram aos estudiosos identificarem o proprietário do monumento.
Para construir a parte subterrânea da pirâmide os egípcios começaram por cavar na rocha um fosso aberto, em declive, a partir de um ponto bem afastado da face norte do monumento (1). Quando tal fosso já atingia a profundidade aproximada de 12 metros, a escavação prosseguiu em forma de túnel por mais nove metros. Nesse ponto o trabalho foi abandonado, provavelmente porque a rocha tornou-se impenetrável para os recursos da época (2). O fosso foi entulhado com pedras até a metade de sua profundidade e um segundo túnel foi cavado imediatamente acima do primeiro (3). O piso do novo túnel continuava seguindo a mesma declividade do fosso, mas seu teto plano permaneceu horizontal por uma distância de cerca de 12 metros. Nesse ponto foi cavado um arco na rocha com cerca de quatro metros de altura e 90 centímetros de espessura, formando assim a parede sul dessa seção do corredor (4).
Dai em diante o teto acompanha a declividade do piso e pouco mais adiante sua continuidade é interrompida por um poço vertical, de seção quadrada com dois metros e 74 centímetros de lado, que atravessa a estrutura da pirâmide e atinge seu exterior (5). O objetivo desse poço era o de permitir a introdução de pesadas portas de pedra que bloqueariam o corredor após o funeral. Bem debaixo do poço, na parede oeste do corredor, existe um umbral (6) que dá acesso a uma passagem em "L" (mostrada apenas na segunda ilustração) que, por sua vez, conduz a uma série de 132 armazéns subterrâneos (7). Eles estão dispostos, de forma desencontrada, em ambos os lados de um corredor em nível que corre inicialmente de leste a oeste e prossegue em ambas as extremidades com braços que se projetam na direção sul. A partir da entrada que dá acesso a tais armazéns, o corredor principal continua em declive até se tornar plano a poucos metros de distância da câmara funerária (8). Esta, cavada de forma rústica, é um compartimento medindo cerca de nove metros de comprimento por cinco de largura e sua altura também é de cinco metros. Foi aberta a cerca de 30 metros abaixo da base do monumento e situada precisamente no eixo vertical da pirâmide. Mais ou menos no meio de suas paredes leste e oeste existem aberturas que vão do chão ao teto e que se aprofundam por cerca de dois metros na rocha e cuja finalidade não se conhece. Na parede sul um limiar leva a uma galeria sem saída (9) e existem outras três semelhantes nas proximidades (10) as quais, provavelmente, estavam destinadas a receber em suas paredes decoração em relevo, representando o faraó oficiando cerimônias religiosas.
Os arqueólogos encontraram o corredor principal selado por espessas paredes de pedra em três pontos: na entrada, debaixo do poço vertical e na entrada da câmara funerária. Encontraram, também, uma coleção de jóias de ouro, certamente fabricadas no decorrer da III dinastia (c. 2649 a 2575 a.C.), embaixo do poço vertical. Dentro do poço foram achados ossos de vários animais, inclusive de bois, de carneiros e de gazelas que eram, sem dúvida, oferendas ao defunto. Também desenterraram 62 papiros da XXVI dinastia (664 a 525 a.C.) e sob eles estavam cerca de 700 recipientes de pedra.
Na câmara funerária, por sua vez, havia um sarcófago fechado sobre o qual havia fragmentos de madeira dispostos em círculo que à primeira vista pareciam uma coroa de flores. Tal sarcófago foi escavado em um único bloco retangular de alabastro e não possuia uma tampa convencional na parte superior. A abertura situava-se em uma de suas extremidades e era fechada por um painel corrediço que podia ser baixado e suspenso por meio de uma corda que passava através de uma chanfradura em forma de "U" no topo do painel. Tanto nas laterais quanto em sua base, o painel possuia saliências que se encaixavam em entalhes abertos nos lados e na base da abertura do sarcófago. Quando encontrado, havia uma espécie de argamassa nos encaixes do painel com o sarcófago, o que parecia indicar que a tampa não havia sido movida desde o momento em que fora colocada em seu lugar durante o funeral. Entretanto, o sarcófago estava totalmente vazio. Duas possíveis explicações existem para o fato: ou a múmia e todos os seus ricos pertences foram roubados com a conivência dos responsáveis pelo funeral, ou essa pirâmide era apenas um cenotáfio.
A muralha que cercava o conjunto funerário foi encontrada apenas parcialmente intacta e é formada por um núcleo espesso de rochas revestidas por pedra calcária branca da melhor qualidade. Assemelha-se muito à do faraó Djoser, apresentando também bastiões retangulares de tamanho uniforme e outros de maiores dimensões. Alguns deles são falsas portas e provavelmente havia só uma porta verdadeira no complexo inteiro, a qual nunca foi achada. A muralha provavelmente atingia cerca de dez metros de altura, dispondo de calçadas e postos para sentinelas em seu topo. As paredes desse perímetro foram erguidas em duas fases. Na primeira, formava um retângulo menor que depois foi estendido para o sul e, principalmente, para o norte. Com tais extensões, aproximou-se do tamanho do complexo de Djoser. A exemplo de seu pai, Sekhemkhet também construiu uma mastaba de blocos de pedra no lado sul de sua pirâmide. Media 32 metros de comprimento por 16 de largura. Sob a extremidade oeste da construção havia um poço que atingia a profundidade de cerca de 29 metros, onde desembocava no teto de uma passagem em nível que dava acesso à câmara funerária. Após o sepultamento o poço foi obstruído com areia e pedras. Apesar da câmara ter sido saqueada em tempos antigos, arqueólogos ainda encontraram nela fragmentos de folhas de ouro gravadas em relevo com um padrão de canas de junco, alguns vasos de pedra, vasilhames de barro, ossos de animais e um esqueleto de criança em um ataúde de madeira.
A Pirâmide em Camadas
Um obscuro faraó, também da III dinastia, de nome Khaba (c. 2603 a 2599 a.C.), deixou inacabada uma pirâmide que ficou conhecida como pirâmide em camadas, situada em Zawyet el-Aryan, localidade não muito distante de Gizé. Supõe-se que teria sido planejada para ter seis ou sete degraus que nunca foram completados. O lado da base tem 83 metros de comprimento. Ela está localizada na parte mais alta da área sobranceira ao vale do Nilo. Estando apenas a 200 metros de distância da planície inundável do vale, é a pirâmide egípcia colocada mais próxima da terra cultivada.
Em um ponto situado cerca de 12 metros do canto nordeste da pirâmide existe um lance descendente de escada (1), com 36 metros de extensão, que atinge um túnel cavado na rocha, o qual se estende até um ponto localizado na direção do centro da face norte do monumento (2). Aí o túnel se junta com a base de um poço de 19 metros de profundidade. Dessa junção partem, ainda, dois outros túneis. O primeiro é uma curta passagem que dá acesso a um longo corredor transversal (3), com 1,4 m de largura e 1,8 m de altura e 120 m de comprimento, que corre inicialmente de leste a oeste e prossegue em ambas as extremidades com braços curtos que se projetam na direção sul por mais 38 metros.
Compartimentos, em número de 32, com 4,60 m de comprimento e 1,6 m de largura, abrem-se em uma das paredes do corredor. O segundo túnel penetra na rocha em direção ao centro da pirâmide e, em sua extremidade, um lance de escada conduz à câmara funerária (4). Enterrada a 26 metros de profundidade, ela mede cerca de 3,65 m por 2,66 m e sua altura é de três metros. Nenhum sarcófago ou equipamento funerário foi encontrado em seu interior, bem como nenhuma inscrição, provavelmente porque a pirâmide não chegou a servir ao seu objetivo final. Existe ainda um último corredor que parte de um nível mais alto do poço na direção sul (5). Existem alguns fatos que indicam que este monumento foi construído na metade ou no final da III dinastia. Entre eles está a crescente habilidade dos egípcios em conseguir manejar pedras cada vez maiores, o que culminou durante o fim do Império Antigo (c. 2575 a 2134 a.C.). O núcleo dessa pirâmide é formado por pedras de tamanho maior do que as usadas na pirâmide de Djoser, indicando que ela é mais recente. A construção também tem uma orientação quase perfeita no sentido norte/sul, o que a maioria dos monumentos mais velhos não apresenta.
A Pirâmide de Meidum
O último rei da III dinastia, o faraó Huni, cujo
reinado se estendeu aproximadamente entre 2599 e 2575 a.C., mandou construir uma pirâmide de degraus em Meidum, próximo da região do Faium. Inicialmente o monumento era composto por sete degraus (1). Depois foi acrescentado mais um (2), tendo a pirâmide atingido a altura de 93,5 metros, o que corresponde
a um prédio de 30 andares. Finalmente, mas já no reinado do primeiro faraó da IV dinastia, Snefru (c. 2575 a 2551 a.C.), e por razões que desconhecemos, os degraus foram preenchidos com pedras e aplicou-se um revestimento externo de pedra calcária polida em toda a estrutura, para transformá-la em uma pirâmide propriamente dita (3), a primeira que se tentou construir no Egito. Os lados do monumento, em sua base, medem aproximadamente 137 metros.
A entrada para a pirâmide localiza-se na sua face norte (4). A partir de um ponto situado pouco acima daquilo que seria primitivamente o primeiro degrau, parte um corredor descendente que penetra inicialmente na pirâmide e depois no solo rochoso. A uma distância de cerca de 58 metros da entrada, o declive cessa e o corredor continua em nível, por sob a pirâmide, por mais nove metros. Nesse ponto projeta-se para cima um poço vertical que atinge o solo da câmara funerária (5). Essa foi erigida com pedra calcária, parcialmente no terreno rochoso e parcialmente no interior da pirâmide, e mede seis metros por dois metros e 60 centímetros. Seu teto é constituído por camadas de pedra parcialmente sobrepostas, formando uma abóbada escalonada, enquanto que o solo é pavimentado também com lajes de calcário. Em seu interior nenhum sarcófago foi encontrado.
Encostado no centro da face leste da pirâmide encontra-se o templo mortuário edificado com pedra calcária. Construçõo simples, ocupa área de cerca de 10 m² e sua altura máxima é de dois metros e 70 centímetros. É formado por apenas três compartimentos, sem qualquer decoração nas paredes. Em seu interior há um altar baixo de calcário, destinado à oferenda diária de comida e bebida para o rei morto. De cada lado do altar ergue-se uma alta laje monolítica de topo arredondado, montadas em bases retangulares e nas quais não existe qualquer inscrição, o que denota que o edifício não foi concluído.
Na pirâmide de Meidum não existe qualquer inscrição que indique quem a mandou construir. Por indícios, os arqueólogos atribuem a primeira fase de sua construção ao faraó Huni. Entretanto, os egípcios antigos atribuiam a obra a Snefru. No interior do templo mortuário foram encontrados grafitos nas paredes e um deles, datado da XVIII dinastia (c. 1550 a 1307 a.C.), diz o seguinte:
No 12º dia do quarto mês do verão, no 41º ano do reinado
de Tutmósis III, o escriba As-Kheper-Re-senb, filho de Amenmesu (o escriba e ritualista do falecido rei Tutmósis I), veio ver o magnífico templo do rei Snefru. Achou-o como se o céu estivesse dentro dele e como se o Sol nele brilhasse. Então ele disse: "Possa o céu chover mirra fresca, possa o céu gotejar incenso sobre o telhado do templo do rei Snefru."
Um espaço aberto medindo cerca de 24 metros de comprimento separa o templo mortuário da muralha que cerca o conjunto. Nela, na direção aproximada da entrada do templo, existe uma abertura estreita que conduz a uma calçada, a qual liga a área da pirâmide com uma construção situada na orla do vale. Atualmente destruída, a calçada media 214 metros de comprimento e estava assentada em um leito de três metros de largura cavado no substrato rochoso da região. De cada lado da calçada erguia-se uma parede de pedra com dois metros de altura, cuja espessura diminuia de um metro e 50 centímetros na base para um metro e 20 centímetros no topo. A calçada não era coberta e em cada uma de suas paredes havia apenas uma porta localizada junto à muralha que cercava a pirâmide. Tais portas permitiam que se entrasse no corredor pelos lados leste ou oeste, sem que fosse necessário atingir o templo do vale para alcançar o recinto da pirâmide. Por outro lado, junto ao templo do vale o corredor da calçada era bloqueado por uma porta dupla, cujo objetivo, provavelmente, era o de impedir que pessoas não autorizadas pudessem prosseguir além daquele ponto em direção ao templo mortuário.
Outras Pirâmides de Degraus
Outras quatro pequenas pirâmides em degraus são conhecidas, mas quase nada sabemos sobre elas. Situam-se nas localidades de Seila, Zawiyet el-Mayiti (ou Zawyet el-Amwat), Tukh e El-Kula. A ilustração ao lado é uma secção da pirâmide de Zawyet el-Amwat. Na pirâmide de El-Kula, a que melhor foi explorada entre elas, não foi encontrada nenhuma abertura para seus subterrâneos. Possui três degraus e seus cantos — e não suas faces como é habitual — estão orientadas na direção dos quatro pontos cardeais. De seu revestimento nada foi preservado. O âmago é formado de grosseira pedra calcária existente na região. A pirâmide de Tukh, construída de pedra não trabalhada, tem quatro degraus. Imediatamente abaixo de seu centro, à guisa de câmara funerária, há apenas um buraco toscamente cavado na rocha e sem nenhuma conexão com qualquer túnel que leve a uma entrada no exterior da pirâmide. É óbvio que o sepultamento só poderia ser efetivado antes que a primeira camada da estrutura da pirâmide começasse a ser assentada, mas a câmara foi encontrada totalmente vazia. Embora essas quatro pirâmides sejam geralmente atribuídas ao período da III dinastia, ainda pairam dúvidas sobre esse ponto e acredita-se que, provavelmente, não seriam pirâmides pertencentes a faraós. |