A AGRICULTURA PARTE DOIS

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O linho, por sua vez, era arrancado quando estava em flor. Agarrava-se um COLHENDO LINHOpunhado com as duas mãos, sacudia-se para fazer cair a terra e cortavam-se os caules em baixo. Os punhados eram amontoados no chão alternadamente, de maneira a formarem feixes com flores nas duas extremidades, e amarrados com uma corda feita ali mesmo com alguns caules que se sacrificavam. Os feixes eram transportados nas costas pelos homens, na cabeça pelas crianças e, às vezes, por burros até o local onde alguns trabalhadores batiam os punhados de linho contra uma tábua inclinada. Parte da colheita era reservada para gerar novas sementes e para o uso em medicamentos.

Era necessário que se fisesse oferenda aos deuses. Os proprietários das terras destinavam à deusa das colheitas, Renenutet, gavelas de trigo, aves de capoeira, pepinos, melancias, pães, e frutos variados. Nas várias localidades os deuses locais recebiam as primícias das colheitas da região. O faraó, no primeiro mês da estação da colheita, oferecia uma gavela de trigo a Min, deus da fecundidade, numa festa a qual comparecia uma grande multidão.

Os trabalhos de ceifa e debulha duravam várias semanas. Para as propriedades estatais e as pertencentes aos templos — áreas consideravelmente amplas — a população local nem sempre era suficiente e se fazia necessário recrutar equipes móveis que iniciavam os afazeres no sul e iam subindo em direção ao norte, encontrando sempre pela frente outros campos prontos para serem ceifados.

COLHENDO UVA Terminada toda essa azáfama, as uvas em altas parreiras já haviam amadurecido. Fazia-se então a vindima, espremia-se os cachos, ânforas enormes eram enchidas e seladas. Obtinha-se vinho das uvas ou a partir das tâmaras e da seiva das palmeiras. Por sua vez os moleiros moiam e esmagavam o trigo durante o ano todo, entregando a farinha ao cervejeiro e ao padeiro. Cerveja era preparada diariamente em vastos armazéns.

Ao inundar o vale, as águas do Nilo vinham carregadas de humo. O limo formado, enriquecido pelo humo vegetal, constituia um solo tão fértil que tornava possível duas ou três colheitas por ano. Diante de tal dádiva da natureza, e desconhecendo as nascentes do rio, era natural que os egípcios criassem um deus do Nilo, Hapi, e cantassem hinos em seu louvor:

Salve, Hapi, aparece na Terra e vem dar vida ao Egito; tu que encobres tua vinda nas trevas... Mar que invade os campos... para dar vida a todos que têm sede. Quando se levanta, toda a Terra clama de alegria, de júbilo exulta todo ventre, vibram os dorsos de satisfação, os dentes trituram.

Quando te imploram a água do ano, vê-se o forte lado a lado com o fraco. Cada homem é chamado com os seus instrumentos. Ninguém quer ficar atrás do vizinho. Ninguém se adorna. Os filhos dos grandes não se cobrem de luxo, não se ouvem cânticos durante a noite.

O camponês, no Egito – nos conta Maurice Crouzet – não tinha vida fácil, exceto nas poucas semanas em que a água, recobrindo toda a região, transformava cada aldeia numa ilhota. Mal o rio baixava, a irrigação, responsável pela nutrição da terra, devia ser constantemente fiscalizada, ajudada, conduzida e mesmo realizada pela mão do homem. Para discipliná-la, bem como para drenar os charcos, fazia-se necessária a construção de diques, a abertura de canais e a reparação contínua de uns e outros. Durante o período de vegetação, era preciso manter o abastecimento de água dos canalículos, pelo menos nos jardins, água esta que era recolhida nos braços mortos, nos poços ou no rio: manejando a vara do balanceiro ou, diretamente, um pesado recipiente, braços humanos levavam a cabo, com tal objetivo, um duríssimo trabalho. Vinha depois a colheita, exigindo numerosa mão-de-obra, repartida por turmas de trabalhadores.

Para alguns egípcios que frequentavam os bancos escolares, era necessário um regresso aos trabalhos do campo. Contra tal pensamento levanta-se um escriba. Segundo ele, todos os ofícios manuais eram desprezíveis, mas o ofício de agricultor mais do que qualquer outro. As pessoas que exerciam essa profissão estragavam-se, assim como acontecia aos utensílios. Agredido e explorado pelos seus senhores e pelos agentes do fisco, roubado pelos vizinhos, pelos soldados-ladrões, traído pelos elementos, arruinado pelos gafanhotos, pelos roedores e por todos os inimigos do homem, tal é o agricultor. A sua mulher é presa, os seus filhos são arrebatados como penhores. Em resumo: o agricultor é o retrato perfeito de um infeliz.