As múmias egípcias são uma fonte inigualável de dados científicos. Elas fornecem informações sobre a aparencia física, as relações familiares, a expectativa de vida, a nutrição e a saúde, as doenças e as causas da morte entre os egípcios. Por muitos anos, a única maneira de extrair informações das múmias consistia em retirar suas bandagens, um processo destrutivo e irreversível. As modernas técnicas não invasivas de criação de imagens do corpo humano, as quais usam os mais recentes avanços da tecnologia dos computadores, tornaram possível olhar dentro de uma múmia sem perturbar, de modo algum, as bandagens que a envolve.
A conservação de múmias, como a que vemos ao lado pertencente ao Museu Britânico de Londres ou das que se encontram no Egito, é um trabalho permanente. O ex-responsável por essa tarefa no Museu Egípcio do Cairo, um senhor afável de nome Nasry Iskander, costuma dizer que é muito melhor trabalhar com os mortos, porque eles dão menos trabalho. Apesar daqueles corpos enrugados serem uma das maiores atrações para os turistas, os arqueólogos tendem a estar mais interessados em hieróglifos ou máscaras funerárias do que em pele e ossos. Trata-se de falta de visão — afirma Iskander —, porque as múmias são o centro da nossa civilização. Tudo o que você vê foi construído pelas múmias: os sarcófagos, as tumbas, as pirâmides, os templos.
Se os cadáveres humanos têm pouco interesse para a maioria dos pesquisadores, pior ocorre com os cadáveres de animais. Durante muito tempo tais múmias foram consideradas como meras curiosidades e eram frequentemente descartadas durante as escavações. Pior ainda, algumas eram usadas como combustível, fertilizante, ou lastro de navio. Até mesmo depois que começaram a ser colecionadas e mantidas em museus, sua frágil condição fez com que fossem presas fáceis de insetos e de outros perigos. Muitas viraram pó.
Os antigos egípcios mumificavam tudo, de cachorros a crocodilos, por quatro razões: os animais podiam ser símbolos de uma divindade, oferendas nos templos, animais domésticos que o morto queria por companheiros no além-túmulo, ou alimento para a jornada eterna. Os pesquisadores do museu do Cairo estudaram mais de 165 múmias de animais e uma nova sala foi inaugurada, em dezembro de 2003, com algumas das mais interessantes. As peças foram identificadas com cartazetes, às vezes com bastante bom humor. Um deles, que acompanha um jogo de costelas embrulhadas em linho, destinadas a uma espécie de lanche para a vida após a morte, diz: Costelas grelhadas são populares já há muito tempo.
Usando máscaras para evitar contaminação por bactérias, os egiptólogos executam o trabalho de preservação dos corpos mumificados. Já ocorreu, por exemplo, que o rosto e o corpo de uma rainha fosse encontrado coberto por um pó branco que os defigurava. Para fazer com que a rainha morta parecesse jovem e sadia, os sacerdotes injetaram gordura animal em sua face. Com o passar dos séculos, a gordura reagiu com o sal usado para dessidratar o corpo, produzindo uma espécie de detergente, o que causou aquele pó branco recobrindo a pele da rainha.
Um dos problemas de conservação dos corpos reside no fato de que 40 anos atrás as múmias reais do Museu Egípcio do Cairo eram expostas em ataúdes comuns. Algumas foram revestidas por cera num esforço de preservá-las, outras foram bombardeadas com raios gama para evitar qualquer florescimento súbito de bactérias. O processo original de mumificação tinha o propósito de manter os corpos tão secos que a bactéria que iria normalmente destruir o corpo não tivesse condições de sobrevivência. Entretanto, depois de viver em tumbas escuras com pouco oxigênio por milhares de anos, os corpos desidratados foram subitamente expostos a fortes luzes, poluição corroedora e proximidade de corpos suados de milhares de turistas a cada ano. Tratava-se de uma séria ameaça à vida eterna e foi por isso que os pesquisadores projetaram caixas especiais que controlam o oxigênio, a temperatura, a poluição e outros fatores. O fruto desse trabalho resultou, em 1994, na abertura da primeira sala daquele museu egípcio destinada às múmias. Outras 12 múmias passaram a ser exibidas, em 2004, em outra sala especialmente preparada para recebê-las.
Bem preservadas, ou não, as múmias egípcias sempre despertaram curiosidade e admiração da humanidade. O egiptólogo Jonathan Elias, que dirige o Akhmim Mummy Studies Consortium, um grupo de trabalho que analisa as múmias da cidade de Akhmin, afrmou certa vez:
Embora os antigos egípcios tenham erguido pirâmides, templos colossais e confeccionado primorosas obras de arte, talvez o elaborado sistema de convicções deles não tivesse hipnotizado tanto a imaginação moderna se as múmias não houvessem sobrevivido. Os egípcios criaram numerosas maravilhas que cativaram a civilização ocidental, mas as múmias são a evocação mais poderosa da própria imortalidade e causam intensa curiosidade. Há mistério num pacote embrulhado: nós ficamos obcecados em descobrir o que tem dentro. Estes seres ainda estão conosco, enquanto tudo o mais se deteriorou. A arquitetura é espantosa e a estética egípcia é linda, mas as múmias são o laço de um pacote de um mundo passado.
Alguns peritos acreditam que 70% das antiguidades de todo o Egito ainda permanecem enterradas em segurança, embora os arqueólogos venham escavando por cerca de 200 anos. Esta afirmativa pode ser contestada, mas ela faz algum sentido. Durante séculos, todos, e não apenas reis ou sacerdotes, foram mumificados e, assim, novos materiais continuam a ser encontrados. Aqui vamos mostrar e discutir alguns dos aspectos mais interessantes e relevantes referentes às múmias egípcias.