Ao longo dos séculos as múmias egípcias têm sido desrespeitadas de várias maneiras: desenterradas, enterradas novamente, de novo desenterradas, vendidas, compradas e até mesmo usadas como combustível para locomotivas, matéria prima de pseudos remédios ou pigmentos para tintas. O problema começou com os próprios egípcios assaltantes de túmulos da antiguidade, arriscando-se pelas riquezas, ainda que estivessem sujeitos a serem empalados se fossem presos. Mas, muito tempo depois, as múmias foram deslocadas ao redor do mundo e postas em exposição.
Os europeus já tiveram o hábito de colecionar múmias como lembrança e realizavam festas nas quais as desenrolavam. Os caçadores de recordações, por sua vez, normalmente retiravam os amuletos com os quais as múmias haviam sido sepultadas e se desfaziam do corpo. Alguns estudiosos acreditam que possa haver múmias enterradas em quintais da Inglaterra. A retirada das bandagens de algumas delas já fez parte integrante de vários espetáculos. Um dos mais antigos de tais "shows" aconteceu em setembro de 1698, quando Benoît de Maillet, cônsul de Luis XIV no Cairo, desembrulhou uma múmia diante de um grupo de viajantes franceses. Durante o século XIX, "desenterrar" uma múmia era o ponto alto de qualquer excursão ao Egito que se prezasse. Para evitar frustração, as áreas a serem vasculhadas pelos turistas eram, antecipadamente, "recheadas" com os corpos. Em 1869, a descoberta de cerca de 30 múmias em uma tumba foi organizada de molde a agradar o Príncipe de Gales, futuro rei Eduardo VII. Os corpos lhe foram oferecidos como presente, levados para a Inglaterra e exibidos em vários museus.
Na Europa ocorria outro item do espetáculo: a retirada das bandagens em sessões públicas. Uma das figuras mais interessantes nessa atividade foi George Gliddon, filho de um comerciante inglês, que passou parte da juventude em Alexandria e ali conheceu os meandros do comércio de antiguidades. Em 1850 ele anunciou, em Boston, nos Estados Unidos, que iria retirar publicamente as bandagens da filha de um sacerdote egípcio, informação que ele obtivera decifrando os hieróglifos que cobriam o sarcófago. A imprensa local divulgou equivocadamente que a múmia pertencia a uma princesa egípcia, o que só fez aumentar o interesse pelo espetáculo.
Nos dois primeiros dias foram retiradas algumas das bandagens externas e no terceiro, 2000 pessoas aguardavam a conclusão dos trabalhos. Entre elas, cientistas e escritores famosos da época. Com a respiração suspensa, todos esperavam enquanto o anfitrião, de forma teatral, cortava o tecido e quebrava os pedaços de resina. Foi ao retirar uma das últimas voltas do pano que Gliddon pagou o maior mico de sua vida: a princesa era um homem. Todos cairam na gargalhada e a carreira do pseudo cientista morreu ali. No alto da página vemos uma famosa imagem de Napoleão Bonaparte diante de um sarcófago durante sua expedição ao Egito.