A reconstrução facial de múmias ultrapassa em muito a simples curiosidade científica por sua importância em estudos antropológicos, médicos e forenses. Na Itália, por exemplo, recentemente foi usada uma múmia da coleção do Museu Egípcio de Turim nesses estudos. Empregando tomografia computadorizada, os pesquisadores reconstruíram a possível fisionomia do morto. Diga-se de passagem que a múmia (foto abaixo) estava bem conservada e completamente envolta em bandagens. A técnica empregada permitiu a criação de um crânio artificial em três dimensões com materiais sintéticos como resina e nylon (foto ao lado).
A criação física da face foi conseguida com avançadas técnicas que formaram camadas progressivas de uma matéria plástica sobre o modelo de fibra sintética da cabeça, de acordo com os dados antropométricos, as condições dos resíduos de tecidos moles desidratados e seguindo critérios científicos e antropológicos universalmente aceitos hoje em dia. A tomografia compudadorizada é o único método não invasivo capaz de fornecer dados fundamentais para reconstruções tri-dimensionais do crânio e do corpo, especialmente com múmias embrulhadas. A múmia estudada, encontrada em 1903 no Vale das Rainhas, pertence a um artesão chamado Harwa, que viveu durante a XXII ou XXIII dinastias (c. 945 a 725 a.C.) e que deve ter morrido com cerca de 45 anos de idade.
Essa reconstrução facial foi feita em várias etapas. Primeiro os dados foram obtidos por escaneamento realizado pelo tomógrafo computadorizado: 355 imagens com 1,25 mm de espessura cada uma foram obtidas em apenas 27 segundos. Depois os dados foram processados com uso de um software especializado. Após a análise dos aspectos externos da cabeça, que foi reconstruída automaticamente pelo programa, foi executada a remoção virtual das bandagens. Por meio de algorítmos préfixados foi obtida também a reconstrução dos ossos cranianos. Desse trabalho resultou uma primeira reconstituição de imagem em 3D da face da múmia, a qual incluia os tecidos moles residuais. O terceiro passo consistiu em gerar os dados de computador para obter dois exemplares da cabeça em resina. O primeiro era uma reprodução altamente precisa do crânio e o segundo era a face da múmia com os tecidos moles residuais que ainda estavam presentes debaixo das bandagens. A reconstrução facial final foi executada, então, no molde do crânio, usando-se a informação dada pelos tecidos moles residuais. Estes últimos deram importantes informações a respeito da morfologia do nariz, da boca, e das orelhas de Harwa. Foram reproduzidos detalhes da face com alta precisão. Até mesmo uma pequena verruga foi captada na pele da têmpora esquerda. Os cientistas também descobriram que o cérebro do morto foi retirado pelo nariz, como era usual, que seus dentes estavam em más condições e que não havia qualquer outra evidência de doença no corpo. Como a gordura não deixa sinais no crânio e o corpo foi desidratado, torna-se impossível descobrir se esse artesão tinha o rosto gordo ou magro. Os autores do estudo evitaram interpretações subjetivas, não acrescentando cabelo, barba, ou cor adicional à pele.
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