Sobre o abate dos bois o autor Pierre Montet nos pinta um vívido quadro. Diz ele: Quando o boi era introduzido no matadouro, acabara a tarefa dos pastores. Começava então a dos açougueiros. Estes, em número de quatro ou cinco, atacavam resolutamente o seu adversário e consumavam o ato por um método que não sofreu grandes variações desde a Antiguidade. Para começar, prendia-se a pata esquerda da vítima num nó corredio e passava-se-lhe sobre o dorso o outro extremo da corda. Um homem agarrava então a corda e obrigava a pata garrotada a erguer-se do solo. Desde esse momento, o animal ficava numa posição instável. Então, era atacado por um autêntico cacho humano. Um homem mais ousado instalava-se-lhe sobre o cachaço e agarrando-o pelos cornos puxava-lhe a cabeça para a retaguarda. Um outro pendurava-se-lhe na cauda. Um último tentava levantar-lhe uma das patas traseiras. Quando o animal se deixava derrubar, colocavam-no na situação de não poder levantar-se, atando uma à outra as duas patas traseiras e a pata dianteira já presa pelo nó corredio. A quarta pata ficava livre. Nenhuma utilidade tinha para o animal vencido que retardava o instante da sua morte enrolando-se como uma bola. Então, um homem corpulento agarrava-lhe a cabeça, curvava-a para trás e mantinha-a imóvel, os chifres apoiados no solo, a garganta descoberta à mercê do golpe. Os açougueiros não dispunham de outro instrumento além da faca bem afiada, de bico arredondado para não perfurar a pele, um pouco mais comprida do que uma mão, e da pedra de amolar, presa a um lado do saiote. O mestre açougueiro sangrava a vítima. O sangue era recolhido num vaso. Se a cena tinha lugar no matadouro de um templo aproximava-se nesse momento um sacerdote e lançava sobre a ferida um líquido contido num gomil. Podia acontecer que o sacerdote fosse, ao mesmo tempo, um funcionário do serviço de saúde. O açougueiro colocava-lhe sob o nariz a mão suja de sangue, dizendo:
Vê este sangue! responde o funcionário que se curvava para melhor poder examiná-lo. Desde esse instante principiava-se a esquartejar o animal com uma maravilhosa rapidez. A perna direita, que se deixara livre enquanto se derrubava a vítima, será a primeira peça a ser cortada. O ajudante mantinha-a em posição vertical, aproximava-a de si ou afastava-a conforme se tornasse necessário, a fim de facilitar a tarefa do carniceiro que cortava os tendões e introduzia a faca nas articulações. A perna cortada era inteiramente abandonada aos transportadores enquanto se separava a cabeça do corpo, e se fendia este para lhe retirar a pele e extrair o coração. As três pernas restantes eram desatadas e cortadas por seu turno. As patas traseiras forneciam três bocados, a coxa, sut, a canela, iua e o pé inset. As costelas eram cortadas sucessivamente em vários quartos, o lombo que era carne de primeira, e o falso lombo. Entre as miudezas, o pâncreas e o fígado eram dois bocados muito apreciados. Quanto ao intestino, o açougueiro tinha a precaução de o erguer progressivamente para o esvaziar. O trabalho avançava por entre exclamações e ordens:
Despacha-te, camarada! Apressa-te, por tua vida! Acaba essa perna! Acaba de lhe tirar o coração! Quando se trabalhava no templo, a chegada do mestre de cerimônias ou só a simples menção do seu nome faziam redobrar o zelo:
De pé, despacha-te camarada, tira-lhe essa fila de costelas antes que o mestre de cerimônias venha fazer a sua tarefa sobre a mesa! Eis o lombo. Leva-o para a mesinha! O interpelado respondia sem manifestar qualquer impaciência:
Faço como queres! Faço o que quiseres! Por vezes, o carniceiro diz a si mesmo, porque foi abandonado pelo seu ajudante: É-me difícil fazer isto sozinho! |